Descobri Hammershoi em “Dublinesca” de Enrique Vila-Matas. Personagem central no romance do escritor catalão, Samuel Riba, o último editor literário, diz: “Sente-se sempre enormemente hipnotizado por este artista dinamarquês. Gosta daqueles quadros onde os mesmos motivos reaparecem uma e outra vez, obsessivamente. Mas parece-lhe que, na arte, o que importa muitas vezes é precisamente isso, a obsessão desenfreada, a presença do maníaco por detrás da obra.”
Nos quadros de Vilhelm Hammershoi, o pintor está sempre presente, com as suas imagens tenazes às voltas com a sua insistência pelos espaços vazios onde, aparentemente não acontece nada, mas atrás da calma extrema e da imobilidade, sente-se o espreitar de um elemento indefinível e ameaçador. A sua paleta de cores é limitada e dominada pelos tons cinzentos. “É o pintor do que se passa quando não se passa nada. Tudo isso converte os seus interiores em lugares de quietude hipnótica e de introspecção melancólica.”
Um encontro feliz com a pintura de Hammershoi. Mais ainda, quando a descoberta me trouxe ao cinema de Dreyer, de “Ordet” e “Gertrud”, que tanto amo. Percebi então que foram precisamente as suas pinturas de interiores e personagens obscuras e austeras quem influenciou Carl Theodor Dreyer, na sua ideia central de cenografias mínimas, quase despidas, mas sobretudo no que à utilização da luz diz respeito. No percurso de Dreyer, as referências à estética de Hammershoi cruzam-se com as suas próprias interpretações da enfatização dramática do real. O uso da luz nos cenários domésticos, o voyeurismo ao universo do quotidiano feminino e o isolamento no campo visual da personagem central são analogias facilmente reconhecíveis entre os dois dinamarqueses.
Deve ser este então o significado de “o mundo é pequeno”.