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A gravidade planta-se no rosto, no ventre.

A gravidade planta-se
no rosto, no ventre.
É o abandono de Deus.
Por isso na montra
os manequins são livres,
fazem uma ideia oca
inversa
vertiginosa de Deus.
Choro-lhes no ombro até que me comova
a forma humana, as coisas a que pede servidão.
Choro na infância o terror frio
da lua, o leite fervido,
a velha náusea que se forma à superfície.
Tudo me lembra a rósea ferida,
a amálgama dos ossos
cujo brilho a noite, a queda, um som
quebrado expõem.
Tudo
lembra o deslace,
Deus e carne
em feia luta.
Que o corpo, em seu afinco,
é um degrau difícil de descer.
Andreia C. Faria, in Alegria Para o Fim do Mundo
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