Feliz o recém-nascido,
(De acordo com as melhores conjecturas queria referir
Como evolui no mundo a nossa Existência), abençoada a criança,
Acariciada nos braços da Mãe, adormecendo
Embalada no seio materno; ela, com a sua alma,
Bebe as emoções no olhar materno!
Para ela, na Presença única e amada, existe
Uma virtude que irradia e exalta
Os objectos através da mais vasta comunhão dos sentidos.
Não é uma exilada, perplexa e abatida;
Ao longo das suas veias de criança
Misturam-se a gravitação e os laços filiais
Da Natureza que a ligam ao Universo.
Aponta para uma flor ainda com a mão
Demasiado hesitante para a colher, mas para ela
Já é o amor, que, vindo da sua mais pura fonte terrestre,
Tornou bela esta flor; já as sombras
Da piedade que chegam de uma ternura interior
Ficam à sua volta sobre o que traz consigo
As cicatrizes informes da violência e do mal.
Forçosamente tal ser vivo existe,
Por muito frágil que seja, ao mesmo temo frágil e débil,
Ele é um ser deste universo cheio de vida:
O sentimento transmitiu-lhe uma força
Que, através das faculdades crescentes dos sentidos,
Como instrumentos do único e supremo Espírito,
Cria, sendo que cria e quem recebe,
Num trabalho que é a aliança com as obras
Que contempla, Tal é, verdadeiramente, o inicial
Espírito poético na nossa vida humana,
Que, devido à uniforme disciplina dos anos,
Em muitos se torna menor ou é destruído; em alguns,
Mesmo que se altere, por se desenvolver ou não,
Ele domina até à morte.
William Wordsworth, in O Prelúdio
Pintura de Albert Anker