“Vida e morte são um rio, com nascente e foz. As margens, ao longo de todo o percurso, mais ou menos alimentadas de acontecimentos, obras, experiências. Mas não são elas o mais importante. Interessa, isso sim, a água que corre, o fio de um corpo que o aperto das margens pode levar à rotura ou deixar fluir livremente. No primeiro caso, o excesso de corrente provoca a sensação de que esse corpo não suporta o caudal. E decide, ele mesmo, suspender um dia a sua jornada, entrar no mar aberto e sem fim, para lá da via estreita em que o seu curso/corpo de água viveu.”
João Barrento, Como Um Hiato Na Respiração, Edições
“O que leva uma mulher jovem e bela a dar esse salto aos vinte e dois anos? As fotografias dirão mais do que as motivações exteriores. Por exemplo: a obsessão da extinção definitiva, depois de dez anos a ensaiar a auto-extinção do corpo pela fotografia – do velamento ao desvelamento do corpo, à sua dissolução em imagens que dão a ver a vertigem do desaparecimento parcial e progressivo de um corpo que oscila entre a plenitude da exposição total e a vontade de discretamente se ir retirando. Não se trata, por isso, de «auto-retratos». O que vemos são séries de representações encenadas de um corpo de que a própria já se distanciou, objectivando-o.”
“A Woodman, por escolha e vocação (logo a partir dos treze anos) destinada a ver-se e rever-se no espelho do “olho da câmara” fotográfica, cedeu, primeiro, ao fascínio do espelho, depois, ao salto mortal para o vazio que este já representava: da profundidade de campo do reflexo do corpo no espelho para a vertigem do abismo.”
João Barrento, Como Um Hiato Na Respiração, Edições Averno