Poeta americano, Billy Collins nasceu em Manhattan em 1941 e cresceu em Queens. Professor, consultor e mentor de várias revistas, promotor de workshops de poesia, foi laureado, entre 2001 e 2003, como Joseph Brodsky ou Stanley Kunitz; escreveria aliás, em 2002, um magnífico poema, incluído nesta antologia, Os Nomes, homenagem às vítimas dos ataques do 11 de Setembro.
Chamam-lhe um campo onde os animais
que foram esquecidos pela Arca
vêm pastar sob as nuvens da noite.
Ou uma cisterna, onde a chuva que caiu
antes da história escorre ao longo de uma placa de cimento.
Qualquer que seja a forma de o ver
este não é um lugar para montar
o cavalete de três pernas do realismo
ou fazer o leitor subir
as muitas cercas de um enredo.
Deixo o romancista corpulento
com a sua máquina de escrever barulhenta
descrever a cidade onde nasceu Francine,
como Albert leu o jornal no comboio,
como as cortinas sopravam no quarto.
Deixa a dramaturga com o seu casaco rasgado
e um cão enroscado no tapete
levar as personagens
dos bastidores para o palco
para enfrentarem a escuridão de muitos olhos da sala.
poesia não é lugar para isso.
Já temos muito para fazer
ao protestar contra o preço do tabaco,
passar a concha da sopa a pingar,
e cantar canções a um pássaro numa gaiola.
Estamos ocupados a não fazer nada –
e tudo o que precisamos para isso é de uma tarde,
um barco a remos sob um céu azul,
e talvez um homem a pescar de uma ponte de pedra,
ou, melhor ainda, ninguém nessa mesma ponte.
Amor Universal, Billy Collins, Averno
trad. Ricardo Marques, Lisboa: Averno, 2014
Hoje
Se alguma vez houve um dia de primavera tão perfeito,
tão animado por uma brisa morna intermitente
que te fez querer abrir
todas as janelas de casa
e destrancar a porta da gaiola do canário,
na verdade, arrancar a pequena porta do seu batente,
um dia em que os frescos caminhos de tijoleira
e o jardim repleto de túlipas
pareciam tão incrustados na luz solar
que até te apeteceu dar com
um martelo no pisa-papéis de vidro
que está na mesa ao fundo da sala de estar,
libertando os habitantes
da sua casinha coberta de neve
para que assim pudessem sair,
de mãos dadas e franzindo os olhos
ao ver esta abóboda maior de azul e branco,
então, hoje é mesmo esse tipo de dia.
Amor Universal, Billy Collins, Averno
trad. Ricardo Marques, Lisboa: Averno, 2014
Rebanho
“Calcula-se que para cada exemplar da Bíblia
de Gutenberg… foram necessárias as peles de 300 ovelhas”
– de um artigo sobre imprensa
Parece que as estou a ver apertadas no curral
por trás do edifício de pedra
onde a prensa funciona,
todas elas se ajeitando
para encontrar um pouco de espaço
e tão parecidas umas com as outras
que seria quase impossível
contá-las,
e não há forma de dizer
qual delas irá levar a notícia
de que o Senhor é um pastor,
uma das poucas coisas que elas já sabem.
Billy Collins, Amor Universal,
trad. Ricardo Marques, Lisboa: Averno, 2014