Descrição
«Desde os anos 60 que se torna evidente o interesse de Herberto Helder por textos oriundos de determinadas culturas que vieram a sofrer grandes mutações, ou de culturas locais, primitivas e anónimas, e que vieram a ser objecto de colonização. Textos, portanto, onde a tradição está sempre presente e é particularmente preservada, mas também ameaçada. São poemas do Antigo Egipto, da Grécia, poemas Zen, arábico-andaluzes, poesia mexicana do ciclo nauatle, poemas esquimós, indochineses, mas também todo um ciclo de textos sagrados como os Salmos do Velho Testamento ou o Cântico dos Cânticos. Os mais recentes livros mostram o mesmo critério, embora o alarguem substancialmente: os textos vêm-nos da Índia, da Austrália, de África e das Américas. A maioria são textos maias e astecas e textos da tradição oral dos diferentes índios da América do Norte, Central e do Sul, como os Navajos e Comanches ou, no Brasil, os Caxinauás e os Guaranis. […] O interesse de Herberto Helder por estas tradições primitivas, não europeias, advém da maneira peculiar como também ele olha o mundo, nele se insere e convive com a linguagem. Nessas tradições, ele encontra a mesma linguagem ritualística, uma vontade de expressão simbólica semelhante e os mesmos valores humanos inseridos numa cosmogonia poética; também a unidade original de todos os elementos da natureza e a ideia de uma metamorfose contínua (nomeadamente por acção do fogo, através de todas as suas manifestações), assim como a imagem do poeta como mago, possuído por uma força animista da linguagem. Todos estes aspectos estão presentes tanto nos textos a traduzir como na poesia própria.»
Maria Etelvina Santos