Descrição
(…) gostaria de saber se já ouviu falar da Documenta de Kassel. Tinha ouvido falar, e muito, disse eu. E mais, alguns amigos, nos anos setenta, tinham regressado de lá transformados, depois de terem visto obras de vanguarda prodigiosas. De facto, Kassel era, por esse e outros motivos, todo um mito dos meus anos de juventude, um mito não destruído; era o mito da minha geração, e também, se não me equivocava, das gerações que se seguiram à minha, pois todos os cinco anos se concentravam ali obras de ruptura. Por trás do mito de Kassel, acabei por lhe dizer, estava o mito das vanguardas.
Pois ela tinha o encargo, (…) de me convidar a participar na Documenta 13. (…) não me tinha propriamente mentido quando me falara de uma proposta irresistível. Sentia-me feliz por aquela proposta, mas contive o entusiasmo. Esperei uns segundos para perguntar o que se esperava de um escritor como eu numa exposição de arte como aquela. Que se soubesse, acrescentei, os escritores não iam a Kassel. E os pássaros não vão morrer ao Peru, disse Boston, demonstrando ser muito ágil a responder. Uma boa frase mcguffin, pensei eu. Seguiu-se um breve, intenso silêncio, que ela quebrou. Tinham-na encarregado de me pedir que em finais do Verão de 2012, ao longo de três semanas, passasse todas as manhãs no restaurante chinês Dschingis Khan, nas aforas de Kassel.
– Chings quê?
– Dschingis Khan.
– Num chinês?
– Sim. A escrever à vista do público.
Kassel não Convida à Lógica de Enrique Vila-Matas